quarta-feira, 9 de junho de 2010

San Andres - El mar de los siete colores - Carnaval de 2008


Lembro da emoção que senti ao desembarcar na Ilha, o mar tem mesmo sete cores, na verdade tem muito mais...

Alguns meses antes eu tinha visto uma matéria sobre uma tal ilha do Caribe que pertencia à Colômbia, não muito conhecida na época (talvez ainda não seja para a grande maioria das pessoas). Fiquei encantada com as imagens que pareciam do Tahiti. Fiquei muito curiosa e não tirei da cabeça a ideia de incluir San Andres em uma próxima viagem de férias.

Normalmente viajamos no final do ano, saindo antes do Natal. Neste ano não seria diferente. Disse bem, não seria... mas foi!

Compramos passagens para Bogotá, Cartagena e San Andres. Passaríamos uns dias em Bogotá, pra conhecer melhor a cidade, coisa que não fizemos da outra vez em que estivemos lá, ficar uma semana em Cartagena, e depois seguir para a Ilha.

Já estava tudo reservado... passagens, hotel... tudo.

Só que nesta época eu estava tentando resgatar algo perdido na adolescência, resolvi começar a andar de patins.

Dia 02/12/2007. Patinando no Parque do Ibirapuera.

Por volta de umas sete e pouco da noite eu já estava cansada. Tirei meus patins e coloquei os tênis. Pra mim, o dia de patinação estava encerrado. Mas por insistência... coloquei uns patins muito maiores do que os meus pés, e com rolamentos muito melhores. O que isso significa? Que anda muito, muito mais...

Dei umas voltinhas pela marquise, deslizei como nunca... mas quando eu já estava voltando, me desequilibrei. Ao invés de jogar meu corpo para trás e cair direito, tentei ficar em pé e acabei caindo pra frente... conclusão, senti na hora que tinha quebrado meu pé.

Era o dia da inauguração da famosa árvore de Natal. Neste horário o estacionamento estava fechado, ninguém podia entrar no parque de carro, apenas sair, e pro meu azar, o nosso carro estava do lado de fora. A marquise foi esvaziando... o socorro demorou. Estava no chão, morrendo de dor e sozinha... esperando... ouvia os gritos, aplausos e os fogos... todos felizes por causa de uma árvore idiota... e eu lá. O segurança que estava tomando conta de uma exposição se aproximou pra me dar atenção e me consolar. Ele me disse que por causa de uma queda com patins ele perdeu a chance de virar jogar de futebol na Europa... que consolo, hein?! Mas de certa forma percebi que a minha situação não era tão ruim quanto a dele tinha sido...

Nada de socorro. O carro não pôde entrar mesmo. Após algum tempo, uma viatura da guarda civil foi me buscar, eles me levaram até o bolsão de estacionamento externo, onde o carro estava.

Chegando no hospital, passei pelo médico e fui fazer a radiografia. Quando voltei para a avaliação, a sala estava ocupada. Fiquei na porta esperando. Tinha um homem sendo atendido. Ele gritava tanto que comecei a ficar assustada, pensei: “Será que ele vai fazer isso comigo também?”. Quase comecei a chorar antes da hora...

Ao ver a radiografia o médico confirmou o que eu já sabia, mas ainda tinha a esperança que pudesse ser outra coisa. Desta vez sim, comecei a chorar! Eu dizia: “Você está brincando, não é verdade!”. Ele até quis se irritar com isso, mas achou melhor rir da minha cara... eu falava: “fodeu... fodeu...”. Ele ria. Perguntei quanto tempo eu ficaria de gesso, e ele respondeu que passaria bem mais do Natal e do ano novo.

Pronto, isso acabou com as férias.

Foi uma fase difícil, nunca tinha quebrado nada em toda minha vida. Mas a experiência me fez sentir na pele o que passam as pessoas com mobilidade reduzida. Eu também tinha acabado de largar meu emprego e estava me preparando para uma nova vida... esse acidente certamente me gerou muitos conflitos internos sobre a decisão que eu havia tomado.
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Foto: Edmilson Sanches
Já que não poderia mais fazer a viagem planejada, o jeito foi passar uns dias no litoral de São Paulo. Ficava o dia todo sentada em uma cadeira com a perna pro alto... às vezes me refrescava com a água do mar colocada em garrafas pet. Que situação!

Tirei o gesso em muito menos tempo do que eu imaginava. Em 38 dias. Passei então a fazer fisioterapia intensiva, queria ficar boa pra poder viajar no carnaval. Se eu conseguisse andar sem muletas já seria lucro.

Aproveitamos as passagens e reservas que tínhamos feito para o final do ano. Mas Bogotá e Cartagena ficaram de fora, não teríamos tempo pra isso. Emendamos a semana do carnaval, o que nos rendeu nove dias de viagem.

Foto: Edmilson Sanches
San Andres é um paraíso caótico. Inacreditável! Ao mesmo tempo em que tem belas praias, tem um centro comercial grande e movimentando. Quase não existem carros, a maioria dos moradores circula de motos. Regras de trânsito? Faixas de pedestre? Nem pensar! Fora a poluição que essas motos causam... é uma loucura! Mas ao andar duas quadras, tudo isso parece não existir.

Por ser uma área de livre comércio, é possível comprar produtos muito baratos, como eletrônicos, perfumes, bebidas, etc. Pra se ter uma idéia, minha mala foi com 15 kg e voltou com 27 Kg, cheia de bebidas e muambas.

Para dar a volta à ilha é possível alugar carros de golfe, chamados de mulitas. A estrada beira o mar em quase toda sua extensão. Alugamos um carrinho desses, claro! Passamos por paisagens incríveis.

Foto: Edmilson Sanches
O hotel em que ficamos, Portobelo, é de um brasileiro, cearense, o Carlos Mendes. Foi o melhor preço que encontrei, os quartos são confortáveis e o café da manhã é muito bom. Carlos nos deu um quarto com vista para o mar. A euforia foi enorme ao entrar no quarto e se deparar com aquela paisagem maravilhosa.

Foto: Edmilson Sanches
A comida não é cara. Na verdade, existem opções para todos os bolsos. Achamos um lugar que servia peixe com arroz de coco... nossa! Muito bom. O prato, com direito a sopinha de entrada, saia por mais ou menos uns R$ 8,00.

A cerveja local também era muito boa, a Aguila, tomava todos os dias, sem exceção!

Na primeira noite, acordei com o som de mariates tocando embaixo da minha janela! Claro que levantei para ver o que estava acontecendo. Eles não estavam caracterizados com roupas extravagantes, mas mesmo assim foi bem interessante. Proximo ao hotel existiam diversos bares, não era um local muito silencioso, toda hora aparecia alguém fazendo performances pra ganhar uns trocados.

Toda vez que escuto “Is this love” do Bob Marley, lembro de um maluco que cantava reggae de mesa em mesa tocando chocalhos feitos com latinhas... ele sempre abordava as pessoas cantando “I wanna love you and treat you right...” e balançando seu chocalho... e não é que ele cantava bem?! Era uma figura interessantíssima, com seus dreads e roupas esquisitas. Um dia ele nos abordou, quando dissemos que éramos brasileiros ele queria que nós tocássemos seus chocalhos e cantássemos algum samba... haha...

Algumas pequenas ilhas ficam bem próximas da ilha principal. Visitei as ilhas Johnny Cay, Acuario e Haynes Cay. Com cinco dólares era possível visitar qualquer uma delas, ou todas ao mesmo tempo.

A ilha Acuario é bonita, mas fica extremamente cheia. Existem muitos peixes que só estão lá porque os turistas os alimentam com pães. No local é possível alugar snorkel, mascara, nadadeiras e até sapatinhos de mergulho para andar sobre os corais mortos.
Em uma ocasião, nesta mesma ilha, um conterrâneo veio conversar com a gente: “Nossa, meu, paraíso nada, olha que ‘muvuca’... meu voo foi horrível... meu quarto cheira mofo...”. E foi um blá, blá, blá... parecia o Marcelo Adnet imitando paulista no seriado Cilada... lembrei disso na hora, foi difícil não rir da cara dele!

Do Acuario é possível ir a Haynes Cay andando na maré baixa. A ilha é muito bonita, mas não tem praia. Tem alguns quiosques que quase sempre estão vazios. Lugar excelente pra fugir da movimentação do Acuario, quase ninguém se arrisca a atravessar o canal andando.

Johnny Cay é o paraíso perfeito. Uma ilha pequena que mais parece aquelas dos desenhos do pica-pau, um pedaço de areia com uns coqueiros no meio. Muitos quiosques, restaurantes e reggae. Ninguém mora na ilha, todos que trabalham nos quiosques vão e voltam todo dia.

Os nativos são negros, na maioria. Eles preservam o seu idioma crioulo, uma mistura de inglês com francês e sei lá mais o quê.

Tivemos contato com crianças nativas no bairro San Luis. Apesar de existir um hotel grande nesta praia, não encontramos muitos turistas andando por ela. O contato com essas crianças foi fantástico, apesar de a comunicação verbal não ter sido lá essas coisas.

Queríamos conhecer as ilhas de Cayo Bolívar e Albuquerque. Algumas imagens que vi naquela reportagem foram feitas nestas ilhas. Não foi possível visitá-las. Elas ficam muito distantes, depois da barreira de corais. Dependia de barco apropriado, das condições do mar, e da procura dos turistas (que não ocorreu).

Fiz apenas um mergulho. Ainda sem credencial. Eu deveria ter feito o curso para me credenciar no começo de dezembro, mas como quebrei o pé, nem isso pude fazer. Acabei aproveitando menos do aproveitaria se já estivesse credenciada, tive que fazer um mini curso e com isso lá se foi um cilindro que eu poderia ter usado mergulhando... mas valeu a pena, foi maravilhoso. Eu só faria o curso aguns meses depois, antes de ir para Los Roques (Venezuela).

Do outro lado da ilha, o menos habitado, existe um lugar chamado "La piscinita", onde também os peixes são atraídos por pedaços de pão. Mas fora isso, o lugar tem água cristalina, muitos corais e água calma. Excelente para passar o dia.

No porto são oferecidos passeios em veleiros. Fizemos um desses. Bom, o que eles chamam de veleiros na verdade não são veleiros, mas tudo bem... O barco praticamente nem sai do lugar, só dá uma pequena volta na baia. O que se faz lá dentro é beber e dançar. Teve até a brincadeira do “mete-lo, saca-lo”... dá pra imaginar o que seja isso, né? Algo parecido com as porcarias que os grupos de axé fazem por aqui. Mas era algo bem engraçado.

Por todo conjunto, essa viagem foi uma das melhores experiências de minha vida. As pessoas bonitas, simpáticas... a comida típica, a cerveja... a vendedora de queijo com goiabada: “casadito a la ordem!”; os vendedores de colarzinhos de corais, as mulheres que faziam tranças: “trança amiga?!”... os malucos “Bob Marleys”... o reggae, a salsa... as compras, o whisky, o rum, o conhaque.. as mulitas... os corais... e tudo mais!!

Não é possível descrever com palavras todas as sensações que eu vivi. É preciso estar lá pra conferir de perto tudo que a ilha tem de melhor a oferecer. Não vejo a hora de voltar.

Como dizia a música mais tocada por lá naquela época:

“...hay hay hay haaaaaay que bonita es esta vida y aunque no sea para siempre si la vivo con mi gente es bonita hasta la muerte con aguardiente y tequila..”
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terça-feira, 8 de junho de 2010

Crise de idade

Nunca imaginei que eu teria crises de idade, mas pelo visto deve ser inevitável, cedo ou tarde elas aparecem.

Este ano eu passei meu aniversário totalmente isolada, em uma cidade pequena, sem comunicação, sem Internet, sem celular... até aí normal, gosto de me isolar de vez em quando. Mas desta vez fiquei refletindo sobre os porquês da vida.

Olhei no espelho e pensei naquela música em que um cara frustrado diz assim: “quando olho no espelho... estou ficando velho e acabado...”. Pois é, não me senti assim tão acabada, mas percebi que as rugas estão aparecendo e o tempo está passando.

É difícil encarar o fato de envelhecer, até porque, ainda me sinto uma adolescente.

Ok, isso é a maior bobagem, claro, eu sei bem disso. Sempre achei o máximo ficar mais velha e consigo enxergar a beleza de cada fase da vida.

Mas essas reflexões me fizeram encarar a realidade. Deve estar na hora de começar a ter um comportamento mais adulto e de assumir mais responsabilidades.

O que quero dizer com isso? Não sei. E esse é o problema.

Nesta cidade pra onde fui neste feriado, Alagoa-MG, senti que a vida que eu imaginava que queria pra mim é totalmente monótona, exageradamente pacata.

A cidade fica na serra da Mantiqueira, tem diversos picos com mais de 2000 metros de altitude e muitas cachoeiras.

Chegamos dia 03 de junho, meu aniversário. Fomos até uma cachoeira, mas como estava muito frio, não deu pra aproveitar muito. Na verdade, nem agasalhada consegui ficar muito tempo sentada em uma pedra, o que dirá entrar na água. Impossível naquele momento.

À noite, vimos a procissão de Corpus Christi, e um pouco antes, uma cena inusitada: um cortejo fúnebre na estrada de terra, o caixão estava em uma pick-up e os moradores seguiam o carro à pé. Toda a cidade mobilizada com a morte do cidadão...

Na mesma noite, cansei de andar pra lá e pra cá procurando alguma bebida “tomável”. Nem parecia que estava em Minas Gerais, não tinha nenhuma cachaça boa nos bares. Por volta de nove e pouco da noite já não tinha mais ninguém na rua.

Conclusão, nada pra fazer à noite. O jeito foi dormir. Na manhã seguinte a ideia era subir um dos picos, a pedra de Santo Agostinho, com 2400 metros de altitude.

Fomos até o bairro Garrafão, onde começa a trilha para o pico. Um lugar muito bonito. Mas a pedra estava encoberta. Não era um bom dia para fazer a subida.

Desistimos. Tínhamos a esperança de que o dia seguinte amanheceria com tempo limpo.

No Garrafão também existe um túnel, uma antiga mina de ouro. Parecia interessante. Não conseguíamos encontrar a entrada da trilha, não existe nenhuma sinalização para os pontos de interesse. Acabamos encontrando a casa de Odir, famoso por produzir um dos melhores queijos parmesão da cidade. Saímos de lá com um queijinho, claro! Ele nos passou informações de como chegar ao túnel. Achamos a trilha, fomos até a entrada da mina, mas sem lanternas era impossível seguir.

Mais uma noite sem nada pra fazer na cidade, desta vez, nem os botecos abriram. A “balada” era na padaria onde tinha uma TV e altofalantes espalhados por todo lado. Posso garantir que as músicas que tocavam não me agradavam nem um pouco.

Não tinha nenhum barzinho agradável, café, doceria, lojinha de artesanato, nada. Os lugares para comer também eram poucos. E a espera pela comida era em torno de uma hora.

O melhor desta cidade são as pessoas, extremamente simpáticas, prestativas e adoram uma prosa... isso ajudou um pouco a passar o tempo (tempo que, aliás, não passava nunca).

O dia seguinte amanheceu com chuva. Decidimos ir embora para Aiuruoca-MG (30 Km por estrada de terra). Eu queria voltar ao vale do Matutu onde tem uma comunidade daimista.

Tentamos chegar em Aiuruoca, mas por causa da chuva, a estrada ficou intransitável. Tentamos então voltar pelo outro lado da estrada, sentido Itamonte-MG, por onde chegamos. Na primeira subida percebemos que por este caminho também seria impossível.

De volta para a estrada de Aiuruoca, mais uma tentativa. Sem sucesso, obviamente.

Decidimos então cortar caminho pelo bairro Garrafão, onde estivemos no dia anterior, já que a estrada até esta parte alta da cidade era toda coberta por cascalho, assim não teríamos que pegar as subidas cheias de lama.

Chegar até lá foi difícil, o carro patinava demais. Mas enfim deu certo. Conseguimos chegar ao asfalto.

Quando percebi que estava presa na cidade entrei em pânico. Tudo que eu mais queria era sair dali. Comecei a me lembrar de quando ficamos ilhados em Ariri, um bairro de Cananéia-SP (mas essa é outra história: “os alagados de Ariri”).

Fomos então para Penedo-RJ, pelo menos lá eu não podia reclamar de não ter o que fazer... Muitos bares, restaurantes, bebidas boas, lojas de artesanato, enfim...

No domingo, passamos no parque de Itatiaia-RJ. Eu até arrisquei um banho de cachoeira, mas não consegui ficar nem 30 segundos dentro d’água. Tentei nadar e senti meus pés congelados, não sentia mais nada. Mas isso me fez um bem enorme.

Feriado, viagem curta... mas o suficiente pra eu perceber que não posso viver a vida que eu idealizei. Sinto muita vontade de sair de São Paulo e levar uma vida tranquila. Mas será que eu conseguiria? A vida na roça é linda, poética... mas as dificuldades pra quem já está acostumado a ter acesso fácil a tudo são muitas.

Chego a ser incoerente com as minhas próprias convicções. Cada experiência nova me faz repensar o que quero, e acabo mudando de ideia... Preciso ter mais maturidade pra encarar a realidade e descobrir do quê realmente preciso. Mas como isso não acontece, acabo sentido o peso de meus trinta e dois anos mais do que deveria.
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terça-feira, 1 de junho de 2010

Manaus, Los Roques e Monte Roraima – Dezembro de 2008

Após oito anos e alguma coisa de espera, finalmente consegui chegar ao topo do Monte Roraima. Onde é isso?? Lá nos cafundó... Onde Judas perdeu as meias, as cuecas e sei lá mais o quê!

Dezembro de 2008, lá estávamos nós outra vez na Venezuela! Quem diria!

Sim! De volta à Venezuela. Só que desta vez, com tudo muito bem planejado para não perder dinheiro, paciência e muito menos os cabelos.

Desta vez a proposta era a seguinte: fazer aquilo que não pudemos da outra vez em que estivemos por lá, ou seja, conhecer o Monte Roraima e o arquipélago de Los Roques.

Ah tá! E onde entra Manaus nessa história?

Bom, como nada que acontece comigo é convencional, e como eu não aprendo mesmo (ou não aprendemos?)... Mais uma vez, passamos noites dormindo em aeroportos, esperando, esperando e esperando mais um pouquinho.

O Roteiro: Seguir de São Paulo a Manaus - AM de avião, e de lá para Boa Vista - RR de ônibus. Por que? Porque o preço da passagem para Manaus custava um terço do valor da passagem para Boa Vista. Para evitar transtornos tentando fechar o pacote da expedição ao Roraima na Venezuela, eu entrei em contato com a agência Roraima Adventures de Boa Vista para fechar o pacote diretamente pela internert, isso facilitou tudo porque pude pagar por depósito bancário, agendar a data correta, ou seja, planejar. De Boa Vista à Santa Elena de Uiaren (cidade venezuelana de onde partem os jeeps para a aldeia Paraitepui) são apenas duas horas.

Mas fomos um pouco precipitados ao comprar as passagens para Manaus. Começamos a viagem dia 20/12, mas o trekking estava previsto para começar apenas dia 30/12. O que faríamos todos esses dias? Como chegar em Los Roques?

Em vários fóruns encontrei pessoas dizendo que existia um ônibus que saía de Manaus com destino à Caracas (Venezuela). Então, pensamos em pegar este ônibus e ao chegar em Caracas comprar as passagens para Los Roques. No entanto, enviei diversos e-mails para a viação que teoricamente fazia este trajeto, mas não obtive resposta alguma. Sendo assim, começamos a lembrar de como foi difícil viajar pelas estradas venezuelanas... Não! Não queríamos passar por tudo novamente.

A solução? Comprar passagens de avião de Manaus à Caracas...
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Janela do Teatro Amazonas - Manaus - AM
Chegamos em Manaus, dormimos no aeroporto e na manhã seguinte embarcamos para Caracas. Ao chegar em Caracas, fomos cercados por homens querendo trocar dólares. Chávez tinha estipulado um câmbio oficial para o dólar no qual os bolivares fuertes eram supervalorizados, mas como os venezuelanos tinham uma cota muito baixa para a compra de dólares, o câmbio paralelo corria solto, era possível trocar U$1,00 por até Bs.F 4,60, enquanto o câmbio oficial era de U$1,00 para Bs.F 2,15. Após negociarmos o melhor valor, trocamos o dinheiro e fomos aos guichês das companhias aéreas que realizavam voos para o arquipélago. No guichê da Chapi Air, conhecemos Raul e Jaisson, dois catarinenses que também estavam embarcando para lá.

Conseguimos as passagens, mas o limite de bagagem era de apenas 10 kg por pessoa, incluindo bagagem de mão. E como a viagem seria longa, tínhamos, muito mais do que isso. Além de ter que pagar cada quilo excedente de bagagem, ainda tivemos que deixar uma das malas com a companhia aérea para que seguisse apenas no voo do dia seguinte.

Os aviões da Chapi Air eram os piores que faziam este trajeto, os menores e mais velhos, mas com o melhor preço de passagens (por que será?!). Pra se ter uma idéia, o co-piloto abre o quebra vento durante o pouso e a decolagem (e ainda coloca o braço pra fora)... é uma sensação única voar em avião que mais parece um fusca 66!
O comandante muito bem humorado perguntou aos passageiros: “Vocês estão com medo?”. E todos responderam: “SIMMM!!”. Ele disse: “eu também!”.

O aeroporto da ilha Gran Roque não tem nenhuma estrutura. O desembarque é realizado praticamente na areia, não é possível nem arrastar malas de rodinha.

Logo de cara conheci Jesus (isso rendeu algumas piadas...), ele trabalhava em uma das operadoras de mergulho existentes na ilha. Pela primeira vez estava no caribe devidamente credenciada para mergulhar!

As pousadas por lá eram caras e bem rústicas. Encontramos a pousada da Magali, com direito a desaiuno, cena e banho frio!

Na primeira janta a Magali nos serviu lagosta. Nossa! Que maravilha! Mas foi só na primeira, depois era sempre frango.. frango frito, frango ensopado, frango assado, frango à passarinho... e o café da manhã então! No primeiro dia adorei comer panquecas, mas depois do terceiro dia só comendo panquecas eu não aguentava mais...

A única praia de Gran Roque fica cheia de barcos, não dá para entrar na água. Para curtir uma simples praia é preciso pegar um barco, o que encarece mais as coisas.

No primeiro dia pegamos um barco e fomos até Cayo de Água, uma das ilhas mais bonitas do arquipélago. Mas eu estava interessada mesmo em mergulhar. Não escolhi a operadora do Jesus. Acabei escolhendo a Eco Buzos, operadora com a qual eu já havia feito contato por e-mail, já estava mais ou menos certo que mergulharia com eles.

Três dias de mergulho. Alguns muito tranquilos e outros extremamente estressantes que valeram como experiência. Por sorte me lembrei de como não entrar em pânico visualizando mentalmente um gráfico do “manual do Rescue Diver”, curso que eu tinha acabado de fazer. Apesar de ter me virado bem, ganhei algumas cicatrizes que tenho até hoje.

Não podíamos nos dar ao luxo de comer e beber em bares e restaurantes, então, repetindo o que fizemos em Aruba, o almoço geralmente era substituído por lanches comprados no mercadinho. Encontramos uma adega que vendia bebidas pela metade do preço dos bares. Todos os dias íamos comprar cerveja (Polar), e lá encontrávamos nossos amigos Raul e Jaisson.

A noite de Natal foi surpreendente, eu não imaginava que conseguiria me divertir tanto. Ao contrário do Brasil, onde as famílias se recolhem e não se vê ninguém nas ruas (o que eu simplesmente detesto!), na Venezuela é justamente o contrário (pelo menos naquela ilha), a festa é na rua. Muita bagunça, festa na praça, bandeirinhas...

Caminhando pela praia um pouco antes da meia noite escutamos um barulho de atabaques, procuramos saber de onde vinha, e para nossa surpresa, era de dentro da igreja. Todos cantavam e dançavam ao som de músicas tradicionais de Natal animadíssimas. Entrei na dança, claro!

Foram dias tranquilos, divertidos, paisagens incríveis, vida marinha exuberante... mas a ansiedade era muito grande, queria mesmo fazer o trekking rumo ao topo do Monte Roraima.

Voltamos para Manaus. Tínhamos que esperar o horário do ônibus pra Boa Vista, então fomos a um shopping onde pudemos comer muito bem, e até pegar uma sessão de cinema.

Umas sete e pouco da noite entramos no ônibus. Desmaiei e acordei em Boa Vista depois de umas dez horas de viagem.


Monte Roraima

Em Boa Vista conhecemos nossos companheiros de trilha, fizemos um briefing e na manhã seguinte partimos para Santa Elena de Uiaren.

Para chegar à aldeia Paraitepui é necessário carro 4x4. Posso dizer que chegar na aldeia já foi uma aventura! A estrada estava muito ruim.

A partir da Aldeia começa a trilha.

Contar o trajeto da trilha não tem muita graça, já entrei em milhares de blogs e de fóruns que descrevem o passo a passo, todos são absolutamente iguais, já que o roteiro de seis dias de trilha é exatamente o mesmo para todos que contratam pacotes. O que eu quero é simplesmente descrever minhas sensações e experiências pessoais.

Nosso guia: Puri Puri.

Nosso herói: Wilson.

O grupo: Fabiane, Edmilson, Chantal, Victor, Hermano, Daiane e Ben Hur. Todos brasileiros.

Com o grupo também seguiram outros carregadores dos quais não lembro os nomes, mas todos muito simpáticos.

As refeições eram preparadas pelo guia e pelos carregadores. Quem mais trabalhava e conseguia fazer mil coisas ao mesmo tempo era o Wilson (carregador, cozinheiro, montador de barracas, entre outras coisas).

No café da manhã comíamos arepas, empanadas e ovos quase todo dia. O almoço era sempre um lanche, ou uma comida mais leve, já que tinha que ser preparado fora dos acampamentos. Mas a janta era reforçada! Até feijoada nos comemos (tudo bem que era em lata... mas numa hora dessas é a melhor coisa do mundo!).

No segundo acampamento, que fica na base do monte, choveu muito, minhas roupas estavam todas molhadas. O peso da minha mochila aumentou, e pra ajudar, a fivela da barrigueira emperrou e eu não conseguia ajustá-la ao meu corpo. Isso certamente dificultou um pouco a subida de 5 Km bem íngremes até o topo.

Sofri um pouco, mas ao mesmo tempo estava feliz por estar ali onde eu tanto queria. Além da chuva constante, atravessamos uma cachoeira. Por teimosia eu não coloquei blusa nem capa de chuva. No topo, a temperatura estava muito baixa, meu corpo esfriou bruscamente no término da subida. Molhada e apenas de camiseta, meus dentes batiam com tanta força que achei que iam quebrar... meus tênis pesavam, estavam encharcados.

Mas mesmo sob chuva, morrendo de frio, e sem saber o quanto ainda teríamos que andar para encontrar um local para acampar, eu estava emocionada. Não era possível observar muita coisa, as formações rochosas se escondiam na neblina, mas era possível observar as bromélias e outras espécies de flores que só existem lá.

Eu já não suportava mais o frio, peguei uma garrafinha de rum e bebi quase metade pra ver se aquecia o corpo. Fiquei louca! De repente comecei a delirar e não sabia mais se era o frio, o álcool, ou o lugar... que é realmente delirante.

Finalmente encontramos uma caverninha, os guia costumam chamar esses lugares de hotéis. Foi sorte! Como chegamos dia 01/01, muitas pessoas que passaram a virada do ano no topo já tinham descido. Aliás, durante a subida, não aguentava mais responder “feliz año, feliz año, feliz año...” para as pessoas que faziam o caminho inverso. ________________
A hora do sopão! Foto: Victor Tartari
Acampamento montado. Wilson nos preparou uma sopa bem quente. Nunca tomei uma sopa de saquinho tão boa em toda a minha vida!

Mesmo assim o frio não passava, comecei a ficar com febre. Tirei a roupa molhada, entrei no saco de dormir, tomei um analgésico e acabei melhorando depois de algum tempo.
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Como choveu muito em boa parte do percurso, nessa hora o grupo ficou um pouco desmotivado, o dia seguinte seria de uma caminhada de 24 km, visitaríamos o ponto triplo (divisa dos três países, Brasil, Venezuela e Guiana). Mas Hermano, com todo seu otimismo, dizia que Macunaima nos proporcionaria um excelente dia. Ele começou a desenhar sóis na porta das barracas... haha... esse foi um dos momentos mais engraçados. Passamos a chamá-lo de “Pai Hermano”.

Inacreditavelmente, ao contrário do que aconteceu nos dias anteriores, e do que seria mais provável, o dia amanheceu sem chuva e o sol logo apareceu... um dia incrível em que finalmente o Monte se revelou para nós. A mandinga de pai Hermano realmente funcionou!!

Lá no topo foram dois dias sem banho, ninguém se atrevia a entrar no rio de tão gelado, o jeito foi usar lenços umedecidos.

Um detalhe importante, tudo deveria ser trazido de volta para a aldeia, inclusive nossas fezes. Isso mesmo, fezes!

Nosso banheiro era um banco de plástico com um buraco no meio, tínhamos que colocar um saco plástico, sentar confortavelmente, e após terminar o serviço jogar cal dentro do saco, amarrar e jogar dentro de outro saco... (Até isso o coitado do Wilson teve que carregar). Um banheiro a céu aberto... que maravilha... ao usá-lo em uma noite, sob a luz do luar, me senti o próprio Clodovil em sua famosa privada na casa de Ubatuba... hahaha...

A descida foi mais fácil, apesar de forçar o joelho.

A paisagem mais bonita de toda a trilha eu só percebi na descida. Rio Kukenán, com os montes Kukenán e Roraima ao fundo.

Foi uma experiência única. Não digo isso apenas pelo misticismo e pelas lendas que cercam o local, ou por suas belezas e peculiaridades, nem mesmo por minha superação física. Mas porque lá parei para refletir sobre as coisas das quais não preciso. Passo boa parte de minha vida preocupada em conquistar algo, sem parar para pensar no quanto já conquistei.

Wilson
Sou privilegiada por ter tido a oportunidade de conhecer este lugar.

O que mais me impressionou foi a capacidade de adaptação das pessoas que vivem do Roraima, que desde pequenas aprendem o ofício de carregar bagagens. É o único trabalho que elas tem, não resta outra opção. Pessoas que passam frio porque não tem dinheiro pra comprar equipamentos adequados, dormem fora de barracas, carregam muito mais peso do que deveriam... e ainda assim, sempre sorridentes, dispostas e extremamente prestativas.


De Boa Vista à Manaus

De volta à Boa Vista. Decidimos ficar alguns dias por lá. A cidade é simpática, limpa e ajeitadinha. Mas ao contrário de nosso amigo Wilson, as pessoas desta cidade não têm muita pressa e não conseguem fazer várias coisas ao mesmo tempo. Pra comer um simples pastel esperamos 45 minutos. É outro ritmo de vida, não dava pra aguentar isso por muito tempo... Decidimos então voltar pra Manaus.

A viagem de ônibus de Boa Vista à Manaus foi perturbadora e engraçada. Pessoas falando, crianças chorando, e a melhor de todas, uma maluca que brigava com o marido por causa de um celular:

- Tu “butô" o celular na bolsa?

- “Butei”... eu “butei”

- Não “butô”!

- “Butei”!

- Tu não “butô” o CARALHO do celular!!

No fim das contas ele tinha “butado” sim o celular na bolsa... ela achou e mesmo assim continuou brigando com o pobre coitado o resto da viagem... sem contar que na parada ela reclamou com o motorista dizendo: “20 minutos não dá nem pra cagar!”.

Quando estávamos chegando, por volta de umas seis da manhã, outra mulher, que devia ter algum compromisso muito importante, decide ligar seu radinho e colocar um forrózinho (daqueles bem ruins) para começar bem seu dia! Tirou um espelhinho da bolsa e começou a tirar a sobrancelha, se maquiar... Incomoda com essa música, outra figura que estava ao lado resolve ligar seu próprio rádio num volume mais alto para competir... nem preciso dizer como estava meu humor nessa hora...

Noite mal dormida. Desembarcamos na rodoviária de Manaus.

Eu tinha dado uma olhada na internet, ainda em Boa Vista, e já tinha alguns nomes de hotéis em que queria me hospedar. Chegando na rodoviária decidimos pegar um táxi, o cansaço era grande e não estávamos a fim de pegar ônibus circular com toda aquela bagagem. Como me arrependi! Antes tivesse ido de ônibus! O taxista, além de não parar de falar, não queria nos levar pra onde eu pedi, queria porque queria que fossemos pro hotel sugerido por ele.

E esse não foi o único taxista que me irritou, não! Um me abordou na rua insistindo para que nós pegássemos o táxi dele. Eu disse: “não, obrigada”. Mais umas duas ou três tentativas e eu disse que ia de ônibus mesmo... indignado, me chamou de pão dura... só me faltava essa!!

Foto: Edmilson Sanches
Não tive a oportunidade de conhecer os lugares certos. Na verdade, fizemos uns passeios bobos, mais porque já estávamos lá do que por outro motivo. A única coisa que me deixou contente num desses passeios, foi pegar uma cobra sucuri no colo.

No centro da cidade fiquei assustada com a quantidade de lixo nas ruas. Nos bares à beira do porto, vi diversas pessoas jogando latas e garrafas no rio. Claro que isso não é muito diferente de São Paulo e de tantos outros lugares, mas isso sempre me incomoda demais.

O clima também não me agradou em nada. Parecia que estava em uma sauna a vapor. O jeito foi encarar uma hora de "busão" pra passar o dia em uma das praias do Rio Negro. Deu pra descontrair, tomar umas cervejas... mas até a água do rio era quente.

Se um dia eu tiver a oportunidade de voltar, quem sabe consiga mudar minha impressão sobre a cidade. Mas por tudo que passei desta vez, posso afirmar que não gostei.

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Foto: Edmilson Sanches

Apesar de ter conseguido visitar os lugares que eu desejava, sei que esta ainda não será a última viagem à Venezuela, ainda falta conhecer o Salto Angel, a maior cachoeira do mundo.
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Voltar ao Roraima também seria incrível...

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