segunda-feira, 1 de junho de 2009

Venezuela, Colômbia e Aruba - Janeiro de 2001

Diário de viagem

Nossa! Há quanto tempo quero escrever um diário de viagens... Minhas histórias já são velhas conhecidas, afinal, eu não paro de contá-las incansável e repetidamente. Mas achei melhor começar a escrever antes que eu me esqueça delas.

Mas por onde começar? Por minha primeira viagem internacional? Ciudad Del Este??
Acho que não... eu era muito pequena, tinha seis ou sete anos... lembro da decepção de não encontrar a boneca Barbie que eu tanto queria... também me lembro do delicioso suco de pêssego chileno e das batatas americanas Pringles... Além, é claro, do esconde-esconde de muambas dentro do ônibus para passar pelo posto da Polícia Federal... Que coisa engraçada! E eu nem conseguia entender o porquê de tudo aquilo... Nós nem tínhamos muito que esconder, minha mãe só comprou porcarias que hoje encontramos de toneladas na 25 de março...

Viajamos no mês de julho, ou era janeiro? Sei lá... Foi no período de férias escolares. Eu estudava em uma escola municipal. Quanto voltei às aulas, a professora pediu que cada um contasse o que fez nas férias. Como de costume, contei com riqueza de detalhes todas as minhas “aventuras”. E o que aconteceu? Fui chamada de mentirosa. Ninguém acreditou que eu realmente tivesse ido até o Paraguai, nem mesmo a professora. Por isso é melhor esquecer... Nada de relembrar traumas de infância.

Como não gosto de roteiros com histórias lineares, vou começar por minha primeira viagem internacional de verdade (Uma grande roubada, sem dúvida!). E, embora faça oito anos e meio, ainda consigo me lembrar de muitos detalhes.

Senta que lá vem história!

Janeiro de 2001. Madureira e eu.

A idéia inicial era ir para o México. Cancún (que beleza! Lugar mais turístico e perfeito impossível!). Tudo estava devidamente planejado, roteiros de museus, praias, pirâmides, etc. Compramos um guia de viagens com todas as informações das quais precisávamos, sabíamos quanto as coisas custavam e de quanto dinheiro precisaríamos para fazer esta viagem... Tínhamos quase tudo. Exceto as passagens aéreas (coisa pouco importante neste caso, não é mesmo?!).
Quando tudo foi planejado achávamos que conseguiríamos passagens aéreas promocionais com um custo muito baixo. Mas isso não foi possível, só conseguiríamos uma passagem, a outra sairia pelo valor normal (muito alto, por sinal).

Sem desistir de Cancún, resolvemos comprar passagens para o local mais próximo possível - com valor bem menor - e depois chegar até lá de ônibus.

Escolhemos Bogotá na Colômbia. Que maravilha! Faríamos então um novo roteiro. Atravessaríamos o canal do Panamá e cruzaríamos toda a América Central até chegar à Península de Yucatán, no México. Na teoria, perfeito, já que tínhamos mais de 30 dias para isso. Poderíamos ter contato com culturas incrivelmente interessantes. Mas na prática não foi bem isso que aconteceu.

Bogotá – Colômbia

Eu cheguei em Bogotá primeiro, pela manhã, voando pela empresa colombiana Avianca. Não falava uma palavra em espanhol, não conseguia entender nada. Ele chegou à noite, voando Varig. Passei o dia todo no aeroporto e tive que me virar pra comer, trocar dinheiro e sobreviver até que ele chegasse e pudéssemos continuar a viagem.

Dormimos em um hotel no centro. Bem confortável e de preço acessível. Pela manhã pegamos um táxi e pedimos ao motorista que nos levasse à rodoviária. Ele perguntou para onde estávamos indo, e ao saber do roteiro, logo nos desencorajou. Disse que era muito perigoso, que para fazermos este trajeto, teríamos que passar por uma área dominada por guerrilheiros das FARC, que poderíamos ser sequestrados.

Meia volta. Voltamos para o aeroporto.

Eu achava que aquilo era exagero, não acreditei que fosse tão perigoso assim.

Segunda tentativa. Outro táxi.

Mais uma vez o motorista nos pergunta nosso destino. E mais uma vez ouvimos o mesmo discurso... Ele nos disse que poderíamos ir, mas que não voltaríamos.

Meia volta.

No aeroporto, tentamos comprar passagens aéreas para atravessar o canal do Panamá, já que este problema existia apenas no lado colombiano. Mas era muito caro para um trajeto tão curto. Ir direto para Cancún? Mesmo preço do que se tivéssemos saindo de São Paulo.

Estavam me colocando tanto medo, que eu só pensava em sair de lá o mais rápido possível.

Nos guichês do aeroporto, olhando todas as opções possíveis, decidimos comprar passagens aéreas promocionais para a Venezuela e desistir de vez de Cancún. Ficamos tentados por Cuba, mas como as passagens custavam o dobro do preço, optamos por Venezuela mesmo.

Caracas - Venezuela

Chegando em Caracas, qual a primeira coisa que ouvimos? Que aquele era um “sitio muy peligroso” (achavam que nós éramos europeus, mal sabiam que estávamos acostumados com a violência urbana de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro).

Já era tarde, pegamos um táxi para nos levar até o hotel mais próximo. O motorista do táxi disse que nos levaria para um hotel com diária de U$ 30,00. Mas ao chegar no hotel, queriam nos cobrar U$ 150,00. Indignada eu disse em bom português: “Nem fodendo, filho da puta, tá achando que sou trouxa?!” (ainda bem que eles não entenderam, e ainda achavam que eu estava falando italiano, por que será, não??). Voltamos para o aeroporto. E o taxista ainda queria nos cobrar a viagem de volta (pode?!).

É inacreditável, mas o aeroporto de Caracas não tem cadeiras, elas existem apenas nas áreas de embarque e desembarque, e como já estávamos do lado de fora, não tínhamos onde sentar. Encontramos então uma porta giratória que levava à área externa, local onde as pessoas observavam pousos e decolagens. Ali existiam bancos de cimento, e neles alguns Rippies dormiam. Pronto! Achamos o hotel ideal, dormimos no aeroporto também.

Amanheceu, compramos um mapa e traçamos o roteiro. Sul da Venezuela, divisa com o Brasil. Queríamos conhecer o Salto Angel, a maior cachoeira do mundo, com quase 1000 metros de queda d’água.

Seguimos do aeroporto para a rodoviária. Pegamos ônibus e metrô. Estávamos cheios de bagagem (afinal, a viagem seria longa), e nessas condições, não foi nada fácil circular pelas ruas da cidade e muito menos utilizar transporte coletivo.
Interessante que tanto nos ônibus, quanto no metrô, as tarifas eram cobradas de acordo com o trajeto, lugares mais próximos, passagens mais baratas, mais distantes, mais caras (imagina se fosse assim em São Paulo... Capão Redondo, Cidade Tiradentes, Parelheiros... já pensou?!).
No metrô este controle era feito da seguinte forma: a catraca devolvia o bilhete após o embarque na estação de origem, e este mesmo bilhete deveria ser inserido na catraca para liberar o desembarque na estação de destino. Claro que não sabíamos disso. Primeiro não entendemos porque a catraca devolveu um bilhete que só continha uma viagem. Mas depois descobrimos quando fomos barrados nas catracas na Estação Gato Negro (deve ter sido este o motivo do “azar”). Compramos bilhetes mais baratos que não nos davam direito de desembarcar naquela estação. Tivemos então que pagar a diferença de valor para podermos sair.

Praticamente todos os ônibus tinham Insulfilm escuro, num tom meio roxo (muitos com estas películas rasgadas). Alguns tinham ar-condicionado, e quase todos tocavam músicas num volume muito alto. Isso me chamou muito a atenção.

Depois de certo “trabalho” para chegarmos até a rodoviária, ainda tivemos que esperar mais um pouco até o horário de partida do ônibus.
_
Santa Elena de Uiaren e Gran Sabana – Venezuela

Na rodoviária de Caracas pegamos um ônibus da Viação Caribe. Umas vinte poucas horas de viagem passando por lugares inóspitos e bizarros. Logo nas primeiras horas de viagem o ônibus quebrou. O lugar era tão quente, que mesmo à noite, a sensação térmica era de uns 40ºC (talvez eu esteja exagerando um pouquinho... mas era quente!). Mais adiante, paramos no Km 88 (o nome da parada era este mesmo... nunca vou me esquecer deste lugar!). Lá comemos umas empanadas (coragem!) antes de continuar a viagem.

Chegando em Santa Elena de Uiaren descobrimos que visitar o Salto Angel sairia muito caro, teríamos que pegar um avião, ou um helicóptero (sem chance!).

Como estávamos na fronteira com o Brasil, fomos até Pacaraima/ RR. Passamos uns dois dias por lá. Não fizemos mais do que comer arroz e feijão, tomar suco de cupuaçu com guaraná em pó, falar português e assistir novela.
O mais engraçado foi ligar pra casa a cobrar, meu pai (que me deixou no aeroporto internacional e sabia que eu estava indo para Bogotá) logo percebeu que se tratava de uma chamada nacional e perguntou onde eu estava... após a resposta exclamou indignado: “Mas Roraima é no Brasil!” (jura?!).

Voltando para Santa Elena, fizemos um passeio pela Gran Sabana, conhecemos algumas cachoeiras e depois ficamos alguns dias acampados no Suruapo, um lugarzinho simpático com uma corredeira, tobogã e um poço para banho.
Nessa região é possível alugar chalés indígenas de pau-a-pique e palha, mas como todo bom mochileiro, tínhamos nossa própria barraca e nossos colchões infláveis de piscina. De lá era possível avistar o Monte Roraima, tentamos fazer o trekking para subi-lo, mas não conseguimos formar um grupo.
_
Isla Margarita - Caribe Venezuelano

Depois desses dias de paz, seguimos para Porto La Cruz, não muito distante de Caracas (não muito diferente também).

Outra coisa interessante nas cidades em que estivemos, era a grande quantidade de táxis circulando, além da insistência e da disputa entre os taxistas para conseguir um cliente. Todos carros velhos, barcas enormes que consumiam muita gasolina (isso nunca foi problema por lá).

Ao chegar na rodoviária de Porto La Cruz, ouvimos a tão mencionada frase: “táxi a la orden”. Não pegamos o táxi, nem ficamos na rodoviária até amanhecer, como imaginávamos. O lugar era um pouco hostil, as pessoas nos olhavam com cara de poucos amigos. Ficamos receosos e saímos, a pé, a procura de um hotel.

E encontramos! O Pipo (disso eu também jamais vou esquecer!). O hotel estava fechado com grades. Tocamos a campainha e a mulher que atendeu nos perguntou rudemente o que nós queríamos (o que seria, hein!?). Sem muitas opções, ficamos por lá mesmo. Um hotel bem vagabundo que virou referência para mim (de onde não devo me hospedar, claro!).

No dia seguinte pegamos o Ferry para Isla Magarita. A viagem durou cerca de quatro horas. Era uma farofa danada, gente dormindo em redes, pessoas bebendo cerveja e fazendo pilhas de latas... E nós, só tínhamos miojo cru para comer (tão farofeiros quanto os passageiros que acabo de citar).

Ao desembarcar do porto, logo procuramos um lugar para ficar, e bem próximo a ele encontramos uma pousadinha simpática, bem simples e barata.

Confesso que senti uma certa emoção por estar pela primeira vez em uma ilha caribenha.

Para circular pela ilha costumávamos pegar ônibus coletivo. Íamos sempre para a praia El aqua, a mais badalada, e de lá andávamos a pé por outras partes pouco exploradas.

Em um desses dias, decidimos ir para a Playa Caribe. Só que desta vez queríamos experimentar a vida de bacana, sentar numa espreguiçadeira, tomar cerveja e contemplar o mar, nada de ficar andando e fotografando.

Para chegar à praia pegamos um ônibus gratuito. Quando perguntamos como poderíamos chegar à praia, nos disseram que teríamos que pegar a “buceta” até um determinado local. Foi difícil segurar o riso. E ao chegar no ponto, mais risos, encontramos a placa “paradero de buceta” (de ônibus pequeno, claro!).

Felizes, pegamos a “buceta”, curtimos a praia, tomamos cerveja e ficamos na espreguiçadeira. Exatamente como planejado. Ufa! Um dia de descanso, certo?

Errado. Não contávamos que, mesmo consumindo bebidas no bar, nos cobrariam o aluguel da espreguiçadeira (dá pra acreditar?! Não era nada especial, era só uma cadeira de plástico mesmo!). Ficamos sem um Bolívar no bolso. Aí pensamos: "Ainda bem que o ônibus é de graça!". Mas ao chegar no ponto descobrimos que o último ônibus do dia tinha acabado de sair. Se tivéssemos dinheiro, pegaríamos um ônibus até Porlamar (centro) e depois outro para o porto, onde estávamos hospedados. Tentamos então carona, mas os poucos carros que paravam não iam para o nosso destino.
O jeito foi pegar um táxi para podermos pagar ao chegar na pousada. Foi aí que me senti em uma cena do filme “Mulheres a beira de um ataque de nervos”, de Almodóvar.

Este táxi era um carro enorme (até aí quase todos eram), nem sei dizer o modelo ou marca, sei que era muito velho e colorido. Os bancos eram revestidos com estampa de onça, existiam muitos penduricalhos no espelho do pára-brisa, tocava música caribenha num volume muito alto, e o melhor, tinha um cachorro e um tigre sobre o painel - aqueles de gesso revestidos com pó de camurça que tem a cabeça presa por molas. A cada buraco que passávamos os dois bichos mexiam a cabeça, sincronizados com o ritmo da música. Inesquecível (e justo neste dia não levamos as câmeras fotográficas, que pena...).

Todos os dias nós comíamos pastelitos, uma espécie de empanada, mas com massa mais leve. Era baratinho e o dono do lugar era muito simpático, adorava conversar. Ele também preparava uma bebida chamada papelon de limon (rapadura ralada com limão.. delícia!).

Próximo ao porto existia um campo de baseball, esporte número um no país. Tentei assistir a uma partida para ver se conseguia entender as regras, mas confesso que não entendi nada, achei a coisa mais sem graça do mundo. Mas gostei de ver as crianças brincando nas ruas... na falta de bastão algumas improvisavam com pedaços de pau mesmo.

Nesta pousada em que estávamos, os quartos não tinham parede, era uma espécie de divisória de madeira, como essas de escritório. Nosso vizinho de quarto nos escutou falando português e entrou na conversa. Era um carioca, que morava sei lá onde, que tinha ex-mulher e filhos na Martinica, e estava na ilha fazendo sei lá o quê.
Em uma das várias conversas com este sujeito, ele nos recomendou que visitássemos a cidade de Valencia para conhecer o artesanato local.

Depois de cinco dias na ilha, seguimos o conselho do carioca. Pra que?! Roubada!

Pegamos o Ferry de volta para Porto La Cruz e, então, um ônibus para Valencia. Mas o destino real era Punto Fijo, onde o mapa que compramos no aeroporto dizia ter Ferry para Aruba. Como Valencia ficava no meio do caminho, decidimos arriscar.

Chegando em Valencia, a maioria das lojas de artesanato estava fechada, e pelo pouco que vi não parecia que era grande coisa, nada que justificasse passar uma noite naquele lugar. Imediatamente compramos as passagens para Punto Fijo. O ônibus vinha de Caracas, e já estava cheio, restavam apenas dois lugares separados. Este ônibus era muito velho e desconfortável, suas poltronas eram estreitas demais. Sentei ao lado de um homem muito obeso que ficava com o cotovelo em cima de mim, e por mais que eu tentasse me encolher, era impossível.
Duro aguentar seis horas de viagem daquele jeito. Comecei a chorar como uma criança, e na parada (depois de três horas) pedi ao Madureira que trocasse de lugar comigo. Ele me disse que o banco dele estava quebrado, e que o homem sentado ao seu lado também ocupava muito espaço. Mesmo assim preferi trocar de lugar. A cada freada que o ônibus dava o banco ia pra frente, parecia que eu estava em uma gangorra.

Punto Fijo - Venezuela

Ao chegarmos em Punto Fijo, descobrimos que não havia Ferry para Aruba, só dava para chegar de avião.
Nossa! Que decepção.
O jeito foi ficar alguns dias na cidade. Só que não tinha muito que se fazer por lá. Nunca vi em toda minha vida um lugar que ventasse tanto. Na rua o vento e as sacolinhas plásticas faziam um verdadeiro balé. Meus olhos não aguentavam mais tanta poeira. Passávamos o dia indo do hotel a um mini shopping. Assisti a todos os episódios do desenho “O laboratório de Dexter” (o que por um lado foi bom pra ajudar a entender melhor o espanhol).
Lá comíamos apenas perro caliente, que vinha com uma salsicha, mostarda, ketchup e muita cebola picada (diferente, mas até que era gostoso).
Não aguentava mais aquilo, decidimos então pagar logo os U$ 100,00 da passagem de avião e voar para Aruba, mas não sabíamos se teríamos dinheiro suficiente para ficar, sequer, um dia por lá. Também não sabíamos em que língua conseguiríamos nos comunicar.

No “mini” aeroporto de Punto Fijo, resolveram revistar toda a nossa bagagem. O guarda quis abrir cada embalagem de creme ou remédio para saber o que era e pra que servia. Superado este constrangimento, embarcamos. O voo em um avião pequeno foi bastante turbulento, mas a vista valeu a pena (na época achei que voar em um avião deste tipo era emocionante, eu ainda não conhecia a Chapi Air, mas essa é outra história).

Aruba - Mar do Caribe, Ilha Holandesa

Praticamente, caímos de pára-quedas nesta ilha holandesa, que é tão organizada, que não nos deixaram sair do aeroporto sem que antes soubéssemos aonde íamos nos hospedar. No início nos ofereceram uma imensa lista de resort´s caríssimos, mas o pânico logo desapareceu quando nos mostraram a lista de apart´s (bem mais baratos, por sinal). A diária dos apart´s variava entre U$ 40,00 e U$ 100,00. Escolhemos o Ingrid´s Apart na rua Madurostrat nº4 (isso é que precisão de informação). Logo de cara a Ingrid, dona do apart, nos disse que Aruba era muito segura, que podíamos andar pelas ruas tranquilamente de madrugada que não havia problema algum, que o máximo que poderia acontecer era algum “maluco” pedir um cigarro (o que de fato aconteceu).
Isso era tudo que eu precisava ouvir depois de tanta pressão na Colômbia e na Venezuela!

No primeiro dia ficamos em um quarto de U$ 50,00, mas logo vagou um quartinho nos fundos por apenas U$ 15,00 a diária. Tudo bem que esse quarto tinha apenas uma cama de solteiro e não tinha ar-condicionado (Ingrid ficou indignada em aceitarmos ficar em um quarto sem ar-condicionado... coitada, mal sabe ela que no Brasil este é um artigo de luxo e não de primeira necessidade!). Então pagamos adiantado dez dias de hospedagem.
Estávamos em Aruba, que maravilha! Mas, além de hospedagem também precisávamos de comida, certo? Devo admitir que nesta viagem comida não era algo de primeira necessidade. Como já estávamos quase sem dinheiro, tínhamos que passar longe dos maravilhosos restaurantes à beira mar. O jeito foi comer pão com queijo holandês e tomar vinho francês, tudo comprado nos mercadinhos dos chineses (globalização!). Essa foi a nossa alimentação durante dez dias (café da manhã, almoço e janta), raramente abríamos uma exceção nessa dieta nada balanceada e comíamos alguma coisinha no McDonald´s (ah, isso sim é dieta balanceada! Mas lá pelo menos tinha panquecas e sorvete de casquinha).

Durante o dia pegávamos sempre o mesmo ônibus que saia de Oranjestad (capital da ilha) e passava pela costa dos hotéis. Às vezes descíamos na praia Palm Beach, frequentada por turistas felizes e cheios de dinheiro. Mas na maioria das vezes íamos para Arashi Beach, praia muito frequentada para a prática de snorkeling.

Andar de ônibus era a opção mais barata, mas para conhecer determinadas partes da ilha foi preciso alugar um carro por um dia, o aluguel não era tão caro, uns U$ 35,00 (tão fácil alugar que conseguimos até com uma carteria de habilitação vencida).
Então pudemos conhecer a costa nordeste onde existem paredões rochosos que com o impacto das ondas mais pareciam cachoeiras, pelo menos por alguns segundos.
Nesta parte da ilha as arvores são tombadas para o mesmo lado devido à ação do vento, o que ajuda a compor uma paisagem muito especial junto ao mar agitado. Neste dia também fomos até a Ponte Natural formada por rocha de coral, um dos locais mais visitados da ilha.

O local mais bonito de Aruba é, sem dúvida, a Piscina Natural chamada Cura di Tortuga, uma pequena piscina de água transparente em meio a uma praia extremamente brava. Para chegar a esta piscina, o ideal teria sido alugar um carro com tração 4X4, mas alugamos um carro comum que não tinha condições de chegar até lá. Tivemos que estacionar e andar quatro quilômetros estrada abaixo. Logo que paramos o carro apareceram vários bodes que ficaram nos cercando... dava até medo de sair do carro e levar uma chifrada. Depois dos bodes saírem, resolvemos fazer um lanchinho antes de começar a caminhada, e então apareceram galinhas querendo roubar nossa comida (e conseguiram, num momento de distração pegaram um saco de pão e o devoraram em segundos). Até um galo resolveu entrar no carro (difícil foi tirar o bico lá de dentro). E como se não bastasse o infortúnio causado pelos animais, apareceu um garoto com problemas mentais querendo nos vender água de torneira.

Esta região é muito seca. Não há água doce na ilha. Toda a água consumida é proveniente de uma usina de dessalinização. Vimos até um bode dilacerando um cacto para beber sua água.

Logo nos primeiros dias, minha única sandália arrebentou, além dela eu só tinha um tênis, e como os calçados por lá eram muito caros, acabei comprando uma sandália vagabunda de E.V.A no mercadinho chinês, e é claro que ela arrebentou mais rápido que a outra. Passei o resto dos meus dias em Aruba com uma sandália remendada com durex... inclusive para ir aos cassinos à noite (isso é que é estilo).

A praia mais bonita de Aruba é a Baby Beach na costa sudeste da ilha. Foi lá que vi pela primeira vez os corais em forma de chifre de alce.

Na cidade de San Nicolas, a sudeste da ilha, existe um bar muito conhecido chamado Charlie’s, cheio de velharias, peças penduradas no teto e placas de carros nas paredes.

À noite íamos para os Cassinos, a maioria deles servia bebidas gratuitamente para os jogadores, e como uma Heineken long neck custava U$ 3,00 na maioria dos bares, o jeito era enrolar em uma máquina cassa-níquel de U$ 0,05 pra poder beber uns choppinhos de graça (pior foi que um dia joguei na máquina de U$ 0,25, ganhei U$ 50,00, fiquei tão feliz que viciei, claro que perdi tudo e mais um pouco nos dias seguintes). Também fomos algumas vezes a uma danceteria no shopping do centro de Oranjestad. Era muito engraçado... Meia dúzia de frequentadores e todos as noites tocava “I will survive”. Deprimente! Mas com certeza existem lugares melhores pra quem pode pagar (e nas noites em que tocava salsa costumava encher de gente, mas nesses dias a entrada não era gratuita).

A ilha tem outras atrações das quais não pudemos desfrutar, e alguns outros locais que não visitamos, como as cavernas, por exemplo. Mas foi muito tranquilo conhecer a ilha, não tivemos nenhuma dificuldade porque a comunicação é fácil, a maioria das pessoas fala pelo menos três línguas, e são extremamente cordiais. E até aquele maluco que veio nos pedir um cigarro também estava preparado para falar mais de um idioma.

Depois de circularmos bastante, sossegamos na praia próxima ao lugar em que estávamos hospedados, ficávamos o dia boiando em nossos colchões infláveis, brincando com as crianças do local - mesmo sem entender um a só palavra do dialeto que eles falavam - e curtindo as “farofas” que os nativos faziam naquele local nos finais de semana... me senti em casa, quase na Praia Grande. Além das “farofas” com churrasquinhos e tudo mais, alguns moradores da ilha se reuniam naquela praia para realização de rituais religiosos, rituais com características muito próprias e especiais.

O carnaval deles, El Bacanal, estava acontecendo naquele mês, janeiro. Não vimos pessoalmente, mas acompanhamos alguma coisa pela televisão, lembro até da musiquinha: "Carnaval, bacanal... Aruba´s bacanal...".

Para mim, viajar e ter contato com essas particularidades de um local é muito mais valioso do que desfrutar do luxo dos resort´s, restaurantes e cassinos. Por isso posso dizer que conhecer este lugar foi uma experiência muito boa. Mas por outro lado percebo que esta ilha não passa de um simulacro. Aruba é um mundo de fantasias onde tudo é perfeito, ou quase perfeito. Para os ricos, é como frequentar um parque de diversões. Nem a polícia (polis) tem muito que fazer por lá. É muito fácil comprar drogas nas esquinas de Oranjestad, e não há repressão a isso (não que eu seja a favor da repressão, muito pelo contrário, tenho uma opinião muita bem formada em relação a isso. É apenas um exemplo de como as coisas neste lugar são surreais).

Depois de vivermos essa experiência, tivemos que voltar à realidade. Venezuela.

De volta à Caracas - Venezuela

Todo caminho percorrido até Aruba, agora deveria ser feito de uma vez. Foram praticamente três dias de viagem (sem banho) até chegar à Bogotá. Avião de Aruba a Punto Fijo. Ônibus de Punto Fijo à Caracas. Metrô e ônibus circular de Caracas até Maiquetia (região metropolitana de Caracas onde fica o aeroporto internacional). Depois, passamos 24 horas esperando o horário de nosso voo para Bogotá (isso é o que dá comprar passagem promocional!). Dormimos mais uma noite no aeroporto de Caracas.

O que mais nos assustou na Venezuela, não só em Caracas, mas também em outros lugares onde estivemos, foi o alto custo de vida. Não estávamos preparados para isso. Comida cara, hospedagem cara. Comemos empanadas, arepas e perros calientes em praticamente todos os vinte dias em que estivemos no país. Tivemos até que fazer alguns saques com o cartão de crédito.
Fora que achei os hábitos alimentares deles muito ruins, até meio americanizados... comidas muito gordurosas, lanches, e até bacon e ovos fritos no café da manhã (senti tanta falta de um pingado e um pão na chapa...).
Em função do alto custo de vida, acabamos gastando muito mais do que planejamos gastar.
No fim das contas, se eu tivesse comprado a passagem aérea de São Paulo direto para Cancún, teria saído bem mais barato.
_
De volta à Bogotá - Colômbia

Chegando em Bogotá, fomos conhecer o museu do Ouro e passear um pouco pela cidade para conhecê-la. Não deu para conhecer muita coisa, mas o pouco que conheci me agradou muito.
O meu voo para São Paulo seria no dia seguinte, Madureira foi embora naquele dia mesmo. Fiquei novamente sozinha em Bogotá. Fui para o mesmo hotel onde me hospedei no inicio da viagem.
O hotel ficava no centro. Acordei, numa manhã de domingo, e fui até a janela do corredor para olhar o movimento da rua. E para minha surpresa a avenida (uma grande avenida parecida com a Av. Ipiranga no centro de São Paulo) estava interditada para carros, somente bicicletas podiam circular.

Fiquei encantada com aquilo! Além das bicicletas no meio da rua, as calçadas eram tomadas por vendedores ambulantes que estendiam lonas no chão para vender velharias como sapatos, partes internas de aparelhos eletrônicos, discos, etc. (Anos mais tarde conheci a feira do rolo em São Mateus, periferia da zona leste de São Paulo, incrível, mas era igual, na hora lembrei desta experiência). Não sei se isso acontecia todos os domingos, ou se era alguma ocasião especial. Mas andar pelas ruas naquele dia foi muito divertido.

Assim como nas grandes cidades brasileiras, existem pessoas cantando, ambulantes, mágicos, pintores, bêbados entre outros. Pessoas fazendo de tudo por alguns trocados. Estava praticamente em casa. Percebi que os colombianos são bem mais parecidos com os brasileiros do que eu podia imaginar, tanto em comportamento quanto em diversidade étnica, pelo menos em Bogotá. Lá eu andava tranquilamente pelas ruas sem parecer turista, existiam muitas pessoas com as mesmas características. O que não aconteceu nos lugares por onde andei na Venezuela, onde as pessoas tinham predominantemente traços indígenas.

No começo da viagem, quando cheguei à Colômbia, eu mal sabia pedir uma caneta emprestada para preencher a ficha de imigração para entrar no país. Na volta, bati o maior papo com o motorista do táxi e com o atendente do guarda-volumes do aeroporto.

Voltei para São Paulo, com algumas fotos e com pequenas histórias. E por mais que eu tenha tentado descrevê-las aqui, deixei de fora muitos detalhes dos quais ainda me lembro muito bem.

Essa foi, de fato, uma grande aventura, que me fez aprender muitas coisas, mas a principal delas foi: Se quiser viajar para algum lugar, compre a passagem para o destino correto!

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Lixo x Seres Humanos

Lixo. Esta palavra traz consigo muitas questões para as quais eu não encontro respostas.

LIXÃO TV, upload feito originalmente por photolilica.

Existem inúmeros trabalhos que abordam esta questão. Há muito tempo escuto falar sobre pessoas que tiram o sustendo do lixo das ruas e dos lixões, não só pela venda de materiais recicláveis, mas também pelo próprio consumo de matérias orgânicas dele tiradas.

Outro dia vi um homem comer um pedaço de pizza que tinha acabado de tirar de um saco de lixo que estava na rua há várias horas, sob sol. Na hora me lembrei que muitos restaurantes não doam as sobras de comida em função da lei que pode responsabilizá-los por possíveis intoxicações alimentares. Vergonhoso. Jogar fora pode, e então ninguém mais se responsabiliza por nada se pessoas consumirem esta comida depois que os ratos já passaram por ela.



Além da situação em si, que já é suficientemente lamentável, também me causa profunda indignação, a indiferença das pessoas - que produzem este lixo - e das autoridades - que nada fazem para solucionar o problema, ou pelo menos amenizá-lo.

Consumo exagerado, desperdício, falta de reciclagem. A quantidade de materiais recicláveis descartada indevidamente é muito grande. O que, além de diminuir a vida útil dos aterros sanitários, propicia condições subumanas de trabalho para aqueles que necessitam desses materiais para obterem renda.

Não vejo nenhum problema na comercialização desses materiais, muito pelo contrário, esta é a solução. Mas é preciso dar condições decentes para que estas pessoas não precisem revirar matérias em decomposição para encontrar uma mísera latinha de alumínio. As cooperativas de reciclagem são uma boa alternativa, mas ainda existem muito poucas.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Trabalho infantil na cidade de São Paulo


Fotos: Fabiane Duarte
Comecei a me interessar pelo tema em 1997, quando fiz minhas primeiras fotos.
Nesta época eu ainda fazia parte de um grupo de fotografia. Algumas fotos fizeram parte de uma exposição coletiva que foi montada na estação Sé do Metrô.
Em 2003 fiz uma matéria em áudio entrevistando algumas crianças e seus pais.
Não preciso nem dizer que ainda hoje, tanto as fotos quanto a matéria continuam atuais.