terça-feira, 28 de setembro de 2010

A viagem que mudou minha vida

Pode até soar estranho dizer que uma viagem mudou minha vida. Mas de fato, algumas experiências  abriram a minha mente de uma forma inimaginável.

Foi em junho de 2007. Finalmente, após muitos anos trabalhando como freelancer -  ganhando por hora, sem direito a férias, décimo terceiro, etc. - consegui alguns direitos na empresa em que eu trabalhava. Fui promovida da categoria “bico” para “assalariada sem registro”. Já era alguma coisa. Pelo menos passei a ter direito a férias remuneradas.

Como eu já tinha usado quinze dos meus trinta dias de férias no final de 2006, restaram mais quinze pra eu aproveitar no meio do ano. Passei então a planejar uma viagem que há tempos eu queria fazer. Destino? Pernambuco. Desta vez eu viajaria sozinha, tinha total liberdade para escolher o roteiro.

Resolvi comprar passagens para Recife. Já com as passagens compradas pensei: “Já que estarei tão perto, acho que vale a pena gastar um pouco mais e ir também para Fernando de Noronha”.

Comprei então novas passagens, de Recife pra Noronha. Consegui um preço promocional após muita insistência, verificando varias vezes por dia as tarifas no site da Varig.

Planejei tudo muito bem para que não acontecessem imprevistos.

Fiz a carteirinha do Hostelling International para me hospedar em albergues.

Tracei um roteiro e o segui rigorosamente.

Meu maior desafio seria encarar todos esses dias sozinha sem entrar em crise. A última vez que tinha tentado fazer isso não aguentei... estava em Florianópolis em uma praia maravilhosa e voltei correndo pra São Paulo, pela primeira (e última) vez passei a virada do ano na Avenida Paulista (visão do inferno, por sinal! Mas isso não vem ao caso agora...).

Cheguei em Recife no final da tarde de um sábado. Fui direto para o albergue de Olinda, onde eu tinha feito reserva. Passei uma noite lá esperando o voo do dia seguinte para Noronha.

Fiquei em um quarto coletivo, mas nele só estava mais uma garota, também paulista. Praticamente não tivemos contato. Naquela noite bateu uma sensação horrível. Fiquei meio depressiva. Comecei a me lembrar do que tinha acontecido em Florianópolis e achei que eu pudesse jogar tudo pro alto outra vez.  Sozinha e perdida no mundo... Depois de algumas horas nessa agonia, consegui dormir. Na manhã seguinte voltei para o aeroporto e embarquei para Noronha.

Por que eu me senti assim? Eu estava em um momento de muita indecisão. Estava buscando, nesses dias de afastamento, algumas respostas que eu não conseguia encontrar vivendo a minha rotina. A maior dessas dúvidas era sobre meu trabalho. Embora eu tivesse conquistado algumas coisas, ainda me sentia injustiçada por não ter alguns direitos. Anos e anos no mesmo lugar esperando um reconhecimento que chegou muito tarde. Fiquei com medo de, mesmo me afastando, não encontrar as respostas que procurava.

Fernando de Noronha

Ao chegar em Noronha foi como se eu estivesse em um sonho, esqueci completamente de tudo que eu havia sentido na noite anterior.
Chovia. No primeiro dia não sobrou muito tempo. Peguei a câmera fotográfica e fui até o forte dos Remédios. Não era o melhor dia para ver a paisagem, já que o céu estava encoberto. Mas ainda assim, avistar o morro do Pico com os Dois Irmãos ao fundo foi sensacional.

Fiquei hospedada na Pousada Nativa. Após enviar diversos e-mails fazendo cotação de preços, esta foi a única pousada que me cobrou tarifa menor por eu estar sozinha. Todas as outras queriam cobrar um valor equivalente à ocupação de duas pessoas. 

No dia seguinte, acordei mais tarde do que o planejado, esqueci que a ilha tem fuso horário com uma hora a mais que Recife. Já não dava mais tempo de fazer o passeio de barco para ver os golfinhos naquele dia. Então, saí andando sem rumo pelas ruas da Vila dos Remédios até encontrar a loja da operadora de mergulho Noronha Divers. Decidi, enfim, fazer um discovery (batismo). 

Para esperar o horário do mergulho, desci até a praia da Conceição e fiquei bebendo em um quiosque.

Nestas “paradas para beber” conheci algumas figuras bem interessantes que me contaram diversas histórias incríveis sobre a ilha.. como o assalto ao banco Real... outros assaltantes malucos que roubaram uma lancha e tiveram que ser resgatados no mar quando acabou o combustível... histórias de fantasmas... de moradores ilustres, etc.

Fui então fazer o primeiro mergulho autônomo de minha vida. Um pouco antes eu tinha escorregado no asfalto e machucado o joelho. Fui para o barco sangrando. No barco estavam duas senhoras cariocas que ficaram preocupadas, com medo de que tubarões pudessem me morder por causa do sangue.. hahaha.. foi ótimo... chegaram até a dizer pra elas: “Não tem problema, os tubarões daqui são vegetarianos”.. haha.. só faltava essa!
E não é que elas tinham uma certa razão?! Pra minha sorte, de todos os turistas, fui a única que viu tubarão naquele mergulho. Nunca vou esquecer da emoção que senti. Sempre fui fascinada por tubarões, desde criança... com uns três anos de idade eu prendi o dedo nos dentes de um pequeno tubarão empalhado no museu do mar em Santos... a minha curiosidade de tocá-lo era tanta que nem me importei com os dentinhos afiados!

Mergulhei com um tubarão Lixa, com cerca de um metro e pouco. O  bicho estava escondido em uma caverninha, quando nos aproximamos ele saiu nadando, e nós (eu estava acompanhada do Divemaster local) nadamos atrás dele por alguns segundos, até não podermos mais alcançá-lo. Lindo demais! Emocionante! Em minha primeira experiência de mergulho tive o enorme privilégio de ver animais maravilhosos em águas límpidas e quentes... simplesmente perfeito.

Descobri ali uma nova paixão (ou amor?): mergulho autônomo. Até então eu fazia apenas mergulho livre... que também pratiquei bastante por lá. Nestes mergulhos pude observar tartarugas, arraias, outra espécie de tubarão (bico fino) e diferentes espécies de peixes que eu não conhecia. 

Fiz outros passeios turísticos pela ilha... Praia do Sancho, baía dos Porcos, Praia do Leão, baía do Sueste, trilha do Atalaia... mirante dos Dois Irmãos, mirante do Forte do Boldró, Forte dos Remédios... Museu do tubarão... passeio de barco para ver os golfinhos rotadores... e mais alguns lugares dos quais não lembro mais.


Sem muito dinheiro, o jeito foi me virar comendo lanchinhos e outras porcarias... comprava pão de forma e frios no supermercado (não sei por que, mas acho que eu já contei essa história antes!). Tudo na ilha é muito caro, comida, hospedagem, passeios... tudo.

Todos os dias foram maravilhosos... foi delicioso ficar descansando na rede... ficar no bar jogando conversa fora... ficar perdida no tempo e no espaço sem preocupação alguma... 
Em uma das conversas de bar, alguém disse ter largado emprego estável, carreira e faculdade pra trabalhar na ilha. Confesso que isso veio muito a calhar... ouvir esse tipo de depoimento ajudou a sanar uma parte daquelas duvidas que eu tinha sobre a minha própria vida...

Olinda e Recife

Marco Zero - Recife-PE
Cinco dias em Noronha. Pouco. Muito pouco. Me arrependi de não ter planejado ficar mais dias. Mas não tinha mais como voltar atrás, meu roteiro estava traçado e Olinda estava a minha espera.

Em Olinda, fui muito bem recebida. Logo que cheguei encontrei um senhor que me levou para conhecer um ateliê onde também aconteciam cantorias, danças, etc. Até hoje recebo e-mails da programação dos eventos (morro de vontade de ir!). Olinda é uma cidade encantadora onde se respira arte, se vive de arte... onde se come muito bem, onde se bebe muito bem, e consequentemente, onde é possível se divertir muito bem!

Voltei ao albergue. Logo na primeira noite conheci um paulista do meu bairro (dá pra acreditar! mundinho pequeno!). E desta vez minha companheira de quarto era uma suíça. Saímos os três para beber aquela noite. No dia seguinte o paulista foi embora para o “São João” de Caruaru e a suíça foi pra Porto de Galinhas, onde nos encontraríamos dias depois.

Sozinha novamente, minha diversão diurna era pegar ônibus e ficar perambulando pelas ruas de Recife. Quando escurecia, eu voltava para Olinda e ia para o “bar do Velho”, onde sempre tinha muita gente e trios de forró tocavam a noite toda.

Nestes dias eu queria mesmo viver a vida urbana e cultural de Recife, andei pelo centro da cidade, visitei museus, bati altos papos com os cobradores dos coletivos que peguei... pude sentir um pouco de “casa” naqueles dias. Mas com a diferença de que era época de festas juninas, e lá eles levam isso muito, muito a sério. Em todos os cantos da cidade tocavam músicas juninas... bandeirinhas e balões espalhados por todo canto... uma programação cultural extensa durante o mês todo. Que delicia! Eu adoro festas juninas! No dia de São João eles têm a tradição de acender uma fogueira na porta de casa. É praticamente sagrado. Incrível.
 
Em meu penúltimo dia na cidade aconteceu, enfim, o que todos me alertaram pra que eu tomasse cuidado. Desde o primeiro dia que cheguei em Recife tive vontade de fazer uma fotografia de casarões antigos refletindo num canal sujo (quase como os prédios refletindo no Rio Pinheiros). O cheiro era ruim, mas a foto certamente ficaria ótima! Decidi fazer a foto, ao atravessar a rua, antes mesmo que eu pensasse em tirar a câmera da bolsa, fui encurralada por dois pivetes que me assaltaram com um pedaço de tijolo (sim, é bizarro!). Logo de inicio eu não entendi o que eles queriam, até que fazendo um esforço percebi que eles só queriam meu celular.. Entreguei o celular e um deles ainda reclamou do modelo.. hahaha.. era um celular bem vagabundo. Conclusão: fiquei sem meu despertador... minha operadora nem tinha sinal na cidade... só usei o celular como relógio, nem me preocupei em fazer o bloqueio imediatamente. Por sorte, não perdi a câmera, mas não consegui fazer a bendita foto! Em todos os meus anos de vida eu nunca tinha sido assaltada, nem mesmo vivendo em São Paulo, mas, como gosto de viver intensamente as experiências dos lugares para onde vou, até isso foi interessante do ponto de vista antropológico... hahahahaha

Porto de Galinhas - Ipojuca

Depois destas “emoções” em Olinda e Recife, peguei um ônibus para Porto de Galinhas. Fiquei hospedada no albergue local. Dividindo o quarto comigo, estava a mesma garota de Olinda. Mas lá pude conhecer umas garotas de Curitiba que estavam em outro quarto.

Em porto de Galinhas peguei maré cheia e chuva todos os dias. Não foi possível fazer o tradicional passeio de jangada pelas piscinas naturais. Elas simplesmente desapareceram. Não tinha muito o que se fazer por lá com chuva. Então eu passava a maior parte do tempo no bar (essa história também é repetida!) com as garotas do albergue e eventualmente com outras pessoas que estavam lá para um congresso não sei do quê. 

Fizemos um passeio de jipe para o pontal do Maracaípe debaixo de chuva. Mas pelo menos deu pra pousar de bacana na foto quando o sol deu as caras e a chuva uma pequena trégua!

Fiz mais um mergulho autônomo. Outro discovery, já que eu ainda não era mergulhadora credenciada. Foi muito mal sucedido. Visibilidade muito reduzida. Eu não tinha experiência e ainda por cima tive problemas com falhas no equipamento, que pelo jeito não tinha manutenção alguma. Acabei abortando o mergulho na metade, não tinha condições de continuar naquela situação. Foi uma experiência ruim, bastante tensa.


Em Porto de Galinhas, aproveitei mais o que a vila tinha a oferecer do que as praias e belezas naturais... até mesmo pelas condições climáticas. Quero muito voltar em outra época do ano para conhecer as tão famosas e cristalinas piscinas naturais. Mas mesmo assim valeu a pena, foram dias de total relaxamento e curtição.

Depois de cinco dias em Porto de Galinhas, voltei pra casa. Voltei ao trabalho também, mas não por muito tempo.

Consegui sobreviver a todos esses dias! Consegui também encontrar algumas das tais respostas que  eu procurava. Dei então inicio a uma nova fase em minha vida: pedi demissão. E embora minha fonte de renda ainda venha de um trabalho burocrático, estou tentando me profissionalizar no mergulho... para que (quem sabe um dia) eu também consiga largar a vida no caos para viver em algum dos muitos lugares paradisíacos espalhados pelo mundo.


Fico feliz por, hoje, ser uma QUASE Divemaster. Não que isso seja grande coisa, mas é um avanço. Pelo menos pude sair do lugar e dar uns passos à frente rumo a tão desejada “realização pessoal”.

Neste momento em que estou escrevendo essa história, estou revivendo um pouquinho de tudo... fiz boas amizades, conheci pessoas muito interessantes, vivi sensações intensas... descobri o quanto viajar sozinha é bom. E que não há motivo algum para entrar em pânico quando surgem as dificuldades, muito pelo contrário.

O isolamento pode ser esclarecedor...

Preciso fazer outra viagem dessas, já estou cheia de novas dúvidas! E como as dúvidas que surgem na vida são intermináveis, espero que as viagens também sejam!



3 comentários:

εïз vanessa disse...

que coisa mais foda!!
juro q to precisando fazer a mesma coisa!
sou apaixonada por recife e porto e imagino o quanto foi bom pra vc ficar por la total sozinha!
quero fazer isso em noronha!
acho q sobrevivo =]

Paula disse...

Olá Fabiane,

pesquisando sobre San Andres, achei um comentário seu, com o link para a sua pagina do flickr.
Tenho um blog que fala sobre viagens, e gostaria de saber se posso usar algumas das suas fotos da cidade creditando a você, claro.

obrigada,
Paula

fabio galvao disse...

Fabiane, oieeeee
Nossa, amei seu blogue. Parabens!
Eu o vi assim por acaso, e realmente me surpreendi
Ja fiz algumas dessas viagens que vc fez tbem. Noronha amei.
Tudo de bom para vc, com muitas boas viagens...
Abraço
Fabinho