terça-feira, 14 de setembro de 2010

Chapada dos Veadeiros


Este ano, quer dizer, ano passado, 2009, eu nem imaginava que pudesse pegar uns diazinhos de folga. Muito trabalho e algumas obras inacabadas em casa, entre outras coisas. De repente, num piscar de olhos, eu subitamente disse: “vamos para a Chapada dos Veadeiros”. Simplesmente fizemos as malas, preparamos o equipamento de camping, abastecemos o carro, e fomos. Até o destino final percorremos mais de 1200 Km.


Muito mais do que paisagens incríveis, o lugar tem pessoas muito especiais...

A entrada do parque nacional está localizada na Vila de São Jorge, pertencente à cidade de Alto Paraíso-GO. Saímos de São Paulo dia 23/12, fizemos algumas paradas para descansar e fomos direto para São Jorge, chegamos na véspera de Natal. Já estava escurecendo, resolvemos ficar no primeiro camping que encontramos, existiam vários, mas simpatizamos com o “Espaço Flora”, mais conhecido como camping do Pedu. Ao chegarmos fomos recebidos pelo próprio e por ninguém menos que Raul (Queixas, não Seixas), funcionário do camping.

Pedu é uma figura fantástica. Ele não estava nem aí pra bagunça. Não repreendeu as festas, bebidas, cantorias... foi extremamente simpático e atencioso durante todo período em que estivemos lá.

E o Raul então?! Fumava uns baseados e não conseguia fazer nada direito... perdi as contas de quantas vezes o Pedu demitiu e readmitir o coitado... Numa conversa, Raul nos contou que foi até Recife de bicicleta. Quanto tempo ele demorou? Dois anos e quatro meses. E não para por aí, ele estava planejando ir para Fortaleza pedalando. Previsão de tempo? Três anos e cinco meses. É, pra mim faz sentido, tempo proporcional à distância...

Despacho? Não, ceia de ano novo!
Todos que estavam no camping nos primeiros dias eram paulistas. Depois começou a chegar o pessoal de Brasília, e mais alguns paulistas. Houve uma grande interação entre todos que estavam no camping, o que tornou a estadia na vila muito divertida.

Era época de cheia, as paisagens mudam muito de acordo com a época do ano. A melhor época para poder aproveitar as cachoeiras é no inverno, na seca.

Em função do volume de água nos rios, algumas cachoeiras não puderam ser visitadas. Choveu todos os dias. Demos sorte de pegar algumas trilhas sem chuva, mas era preciso estar preparado porque ela aparecia sem o menor aviso.

Visitar as atrações sai caro. Como a maioria delas fica em propriedade particular, ou no Parque, o acesso é pago. R$ 10,00 aqui... R$ 8,00 ali... e por aí vai...


O Vale da Lua, um dos principais atrativos da Chapada, tem acesso fácil, fica a uns 800 metros da casa dos proprietários, mas como na ocasião fazia duas semanas que um casal tinha morrido ali, fomos obrigados a seguir com o acompanhamento de guia.

Outras trilhas exigiram acompanhamento de guias. No parque era obrigatório. Embora não houvesse a menor necessidade. Mas de certa forma, é assim que a renda de muitas pessoas que moram na vila é gerada.


A melhor trilha, e também a mais puxada, é a que leva a uma parte alta conhecida como “Janela”, de onde é possível avistar as cachoeiras do parque. Da janela, seguimos para o “Abismo”, onde se forma uma cachoeira temporária na cheia. Era o período ideal para conhecer.

Cachoeira do Abismo
Um dos guias que nos levou às trilhas do parque foi o Alexandre. Uma figura muito engraçada. Vegetariano e totalmente “natureba”, ele faz o próprio pão, não consome nada industrializado ou feito fora de casa. Senti uma certa inveja quando ele disse que no quintal de casa tem uma cachoeira e uma piscina termal. Que coisa mais desagradável! Queria ter só um pouquinho da qualidade de vida que ele tem...
Vista da "Janela"

Com chuva na maior parte do tempo, não restava muita coisa para fazer além de beber. A cachaça mais tomada por lá não é a 51, mas sim a 88 (será que faz referência à graduação alcoólica??). Claro que nem de curiosidade eu experimentei... quem bebia esta cachaça era o Pedu. Embora naquele momento ele estivesse na fase sóbria... ele disse que quando começa a beber são seis meses sem parar, depois ele para por seis meses, e pra justificar ele solta essa: ”Também! Aqui não tem nada pra fazer, não tem nem cinema!”.

O bar das piscinas 
Também existem piscinas termais na região, não são grande coisa, mas deu pra dar uma relaxada, principalmente quando a chuva e o frio não davam trégua. No bar das piscinas era possível tomar  cachaças mineiras como Boazinha, Seleta, Maria da Cruz, entre outras.  Lá também ouvi umas histórias hilárias. Uma garota nativa de São Jorge estava contando suas aventuras na cidade grande, provavelmente Brasília. Ela falava de forma muito esquisita (com uma voz lenta e cantada) e usava muitas gírias. Estava contando sobre sua dificuldade de se comunicar com surdos antes de aprender libras. Parte da história era assim: ela ficou incumbida de buscar uns amigos de sua irmã, todos surdos. Estava dirigindo. O tráfego lento. O trânsito a deixou desesperada. Nesse tempo ela pensava no quanto queria fumar um baseado pra aliviar a tensão, mas não podia, já que estava dando carona para pessoas desconhecidas. Mas como a tentação era muito grande ela decide fumar, pra sua surpresa todos aceitaram... ela encerra dizendo: “Vééiiooo!! Não acreditei! Quatro surdos maconheiros!!”.

Precisa dizer alguma coisa?
No bar do seu Claro (o preferido do povo local) a cerveja era mais barata e a diversão garantida. Dei muitas risadas com o “pancadão” criado pelo pessoal que compõe o bloco de carnaval da vila: “O helicóptero, o helicóptero... ele gira lá em cima a gente gira aqui embaixo...” (naquele exato momento eu estava girando mesmo). Claro que essa era uma brincadeira satirizando as músicas de “sucesso” do “funk” carioca, mas as marchinhas de carnaval falam sobre o cotidiano, belezas e personagens de São Jorge.

Bar do Waldomiro
E como não falar do seu Waldomiro?! O homem das cachaças curtidas e da famosa Matula (prato típico da Chapada). Num dia frio fomos até lá experimentar algumas das especialidades da casa, aproveitamos para almoçar. Ao chegarmos fomos recebidos como se fossemos velhos conhecidos, ele fez questão de cumprimentar um por um e dar as boas vindas.


No "jardim dos Gnomos"
Cansados de pagar, pagar e pagar. Fomos a um parque municipal, bem perto do camping. O lugar era lindo, parecia um jardim de gnomos, cheio de flores do cerrado e até um pequeno laguinho para banho (que também desaparece na época de seca).

Neste local passa o rio Preguiça (nome bem apropriado). Inacreditavelmente pude ter visões naquele lugar... assim como o Raul.. Ah.. eu não contei essa sobre ele! Em uma das vezes que foi demitido pelo Pedu (após fumar um, claro!), ele decidiu ir até a beira do rio para refletir.. voltou dizendo que teve uma visão, que viu a luz, que entendeu a razão da existência, ou qualquer coisa assim: “Eu tive uma visão e cheguei a uma conclusão!”. Qual foi essa conclusão? Ele respondeu: “Não posso revelar...”. Haha.. se me perguntarem quais visões eu tive, não vou responder o mesmo que o Raul... ele não podia revelar, mas eu simplesmente não consigo me lembrar.. haha


Depois de muitos dias no mesmo lugar, fomos embora para Brasília e de lá para Pirenópolis. Saí de São Jorge com o coração partido, sabendo que o lugar e as pessoas deixariam muitas saudades.

Depois de dois dias em Pirenópolis, tentamos conhecer Caldas Novas, eu queria fazer mergulho em água doce. Ao chegarmos na cidade eu fiquei assustada com a quantidade de gente, com os carros tocando músicas tão alto que a vibração fazia disparar os alarmes dos carros parados. Trânsito. Muito trânsito. Parecia a Praia Grande na época do carnaval. Desistimos de conhecer a cidade. Eu queria sair de lá e voltar pra casa o mais rápido possível. E foi o que fizemos.



Vou guardar ótimas lembranças deste paraíso no cerrado... 



Um comentário:

Marcelo Fabri disse...

Belo post. Voltarei para ler os mais antigos. Já vi que o anterior a esse também é de viagem. Sei que vou gostar.
Beijo
Marcelo